Antigamente, o que se entendia por método realista em cinema, era fazer uma espécie de transposição, por analogia, do naturalismo e literatura. Descrever linearmente o comportamento, ambiente e situações com todas as minúcias. A partir do néo-realismo, sistematizou-se o emprego de outro elemento: a técnica do filme documentário, ou mesmo posteriormente, o próprio documento em si. Noutro salto mais avantajado, chegou-se à dialética documentária e ficção, aos depoimentos filmes-entrevistas, desformalização dos processos de iluminar etc. Hoje em dia para usar uma dicotomia filosoficamente superada, sabe-se que, através da forma chega-se muito mais depressa ao chamado realismo, do que mediante o conteúdo (mero arquetipo anedótico).
Há alguns anos com o seu impecável Salvatore Giuliano, o diretor Francesco Rosi usou o filme como uma admirável ferramenta do conhecimento. Tomadas, depoimentos, registros e montagem acima de tudo; Uma dialética a corresponder a um certo descascamento das superfícies dos acontecimentos a fim de tentar detectar a essência de relacionamento de conflitos e contra-posições que geram o estado do real, que é o dos possíveis. Com isto. presume-se, invoca a maior participação dialética do espectador, obriga-o no mínimo, a pensar.
Agora, com O Caso Mattei, em cores (Giuliano era abordado em preto-e-branco), repete a dose, ou seja, o proceso. Possivelmente, até com maior brilho cinegráfico na superfície. Mas, sobrepairam duas observações. Primeiramente, a repetição do processo de um modo geral - o que já limita a invenção, concebida em termos de estrutura. Em segundo lugar, uma observação mais crítica. Esse método realista no cinema, de documentar os possíveis ou verídicos fatos em torno de um outro - ponto de convergência (no caso, acidente que fez explodir o avião particular de Mattei) – impõe a impessoalidade, pelo menos direta, na apresentação e concatenação dos dados. Mas, no meio da dúvida que ainda paira dez anos depois - acidente ou crime? - Rosi, em duas cenas, força o seu recado particular. Especialmente naquela do final, onde, enquanto, numa lona, carregam os homens o que seriam os restos das vitimas, retornam as palavras do protagonista a respeito da escalada pelo petróleo. Assim, o "método" quase que vira papo furado.
Com as necessárias ressalvas, fica a boa impressão de um filme bem arquitetado, onde, com um pouco de boa vontade, o espectador se sente dentro dos acontecimentos presentificados através de um critério de montagem bastante elaborado. E além disso, a notável recriação do personagem real por Gian Maria Volonté - sem dúvida um dos grandes atores da atualidade.
Última Hora
18/12/1972