Chegou na Avenida Marechal Floriano, aproximou-se de uma porta onde estava um homem baixinho, com lenço branco amarrado no pescoço e guimba no canto da bôca, e pediu: "me empresta o retrospecto". O outro tirou umas fôlhas de papel do bôlso e estendeu-as discretamente.
Nesse interim, o detetive que passava ali ouviu o pedido e pensou: "são bookmakers – ha, ha - vou até ali, na Delegacia de Vigilância, pegar um choque e prender todo mundo". Apressou os passos.
Enquanto isso o apostador exclamava para um outro que chegara: "veja só: 65 assaltos, apenas, durante cêrca, de um ano; 3 bilhões fora da rêde bancária; o Instituto de Resseguros está em pânico". O outro completou: "vamos aos dados estatísticos, ao retrospecto, quero apostar de uma vez!" Começaram a esmiuçar os detalhes. O homem da guimba voltou a esclarecer: "quem acertar o nome do banco ganha 30 vêzes o que apostou; se acumular com o Estado onde ocorrer o assalto, ganha 60 vêzes; se acertar a agência, ganha 500 vêzes, e se acertar a quantia roubada, recebe 5.000 vêzes mais." "É hoje ou nunca! Exclamou o primeiro apostador". Não hesitou mais; apanhou um papel carimbado que o homem da guimba lhe deu, preencheu as quatro linhas e deu-lhe cinco notas de 10 cruzeiros novos. Nessa altura, com o detetive a frente, chega correndo o choque da Delegacia de Vigilância. Debandada. Atropê-lo. O homenzinho da guimba sumiu como se tragado pela asfalto. Buzinas. Catam o nosso apostador pelo cangote. "Está prêso em flagrante; seu moleque!" Outra voz autoritária: "vai para a Ilha Grande!". Suava em bicas: "por quê?, por quê?" "Ora, porque! porque estava praticando contravenção, estava apostando no bookmaker, ouvi você pedir o retrospecto" - agora era a voz eufórica do detetive. "Nada disso, juro!'' “Ha, ha, ha, olhem, êle jura descaradamente". Continuou negando. "Então, era o jôgo do bicho - o que dá no mesmo". ''Não era bicho, não senhor". Ninguém acreditou nele e foi levado, empurrado, para o recinto da Delegacia, sob os gritos de "confessa logo, confessa logo!" Explicou então que se tratava de uma nova instituição ou seja, um sistema de apostas baseado no banco que viria a ser assaltado cada dia. Apostava-se em tudo, no nome do banco, na cidade, na agência e na quantia roubada. "De qualquer forma", disse o detetive, "é uma contravenção; o sr. vai para a Ilha Grande". Já estava começando a chorar, quando entrou, esbaforido um guarda: "acabam de cometer nôvo assalto, foi sensacional! foi aqui entre a delegacia e o Ministério do Exército". O prêso então: "aonde?" "Na agência de Banco Andrade Arnaud, levaram 75 milhões”. Começou a dançar eufórico, siderado: "acertei tudo! fiquei milionário! viva! vou comprar a Ilha Grande!" E têve um colapso de glória no meio da azáfama.
Correio da Manhã
01/04/1969